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Uso de lenha no México também impacta na força da mulher mexicana no mercado de trabalho

Para finalizar a nossa trilogia de artigos sobre o uso da lenha na América Latina, analisaremos como México, um dos países com grande número de estudos publicados sobre o tema, lida com os impactos da lenha na população e na saúde pública. As publicações foram consolidadas e estudadas pelo “Levantamento de estudos científicos sobre o uso de lenha na América Latina”, da Professora Dra. Adriana Gioda, Coordenadora do Laboratório de Química Atmosférica (LQA) da PUC-RJ. Além desses países, a pesquisadora aborda ainda, de forma geral, como os combustíveis de biomassa sólida, como a lenha, são menos eficazes como fontes de geração de energia em comparação com combustíveis modernos, como o gás liquefeito de petróleo (GLP) ou a eletricidade. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 3,8 milhões de mortes, ao ano, ocorrem devido a poluição do ar doméstico, causada pelo uso de lenha em tarefas domésticas.

Em um dos estudos analisados, pesquisadores mexicanos buscaram determinar se a exposição à queima da lenha causa problemas respiratórios e sua relação com os impactos na força de trabalho. Estudiosos do Centro de Investigaciones y Estudios Superiores en Antropología Social e de Estudios Económicos encontraram resultados que apontaram que as mulheres sofrem mais com problemas respiratórios por cozinharem com mais frequência e, consequentemente, ficarem mais expostas à poluição interna. Essas mulheres, por terem maior propensão a problemas de saúde, têm menor participação no mercado de trabalho. De forma geral, a lenha impacta não somente a saúde e bem-estar, mas também na geração de renda dessas famílias que, com menos pessoas trabalhando, veem crescer o risco iminente do empobrecimento. De acordo com o estudo, os homens, por outro lado, praticamente não tiveram sintomas.

Além disso, em outro levantamento, feito pela Universidad Nacional Autónoma de México, sobre os padrões de uso doméstico de lenha no México de 1960 até 2019 (Serrano-Medrano et al, 2019), foi previsto um cenário para 2030. Nessa pesquisa, foi considerada a evolução provável do uso futuro de lenha de acordo com diferentes variáveis sociodemográficas e tecnológicas junto aos impactos ambientais esperados. Apesar do país ter passado de importador a exportador¹ de petróleo no período histórico analisado e, com isso, intensificado o uso de GLP no setor residencial, não houve declínio no uso de lenha, como seria esperado no modelo de transição de energia. Curiosamente, o uso de lenha permaneceu praticamente constante por mais de 40 anos.

No entanto, os números mostram uma leve queda ao longo dos anos. Os dados analisados apontam que, para o ano de 2030, é estimado uma queda do uso da lenha em torno de 5% comparada com 2020. Outro estudo interessante realizado no país, foi a comparação da exposição de mulheres saudáveis fumantes e expostas a queima de lenha. A exposição crônica à queima de lenha induziu alterações distintas de citocinas inflamatórias sistêmicas em comparação com fumantes em mulheres saudáveis, ou seja, a poluição causada pela queima de lenha afeta de forma diferente o organismo quando comparada com a de cigarro.

Como vimos ao longo das análises feitas no decorrer dos três artigos publicados, é alarmante o risco do uso da lenha para a sociedade como um todo e está fortemente associado à pobreza, falta de acesso a combustíveis limpos e disponibilidade de biomassa em algumas regiões. Por fim, vale ressaltar que na América Latina, 15 % da população usa combustíveis sólidos para cozinhar e aquecer. No México, 4,1 milhões de domicílios (15 %) usam lenha, correspondendo a exposição de aproximadamente 19 milhões de pessoas. No Chile, mais de 10 milhões de pessoas estão expostas a concentrações de material particulado (PM2.5 – PM10) acima dos níveis aceitáveis. A principal fonte de emissões nas cidades do sul é o uso extensivo de lenha no setor residencial para cozinhar e aquecer. Já no Peru, por exemplo, 34 % da população, aproximadamente 11 milhões de pessoas faz uso de lenha e, consequentemente, está exposta aos poluentes gerados.

1 Hoje em dia o país é importador de derivados de petróleo, inclusive do GLP.