Na semana passada, tive o privilégio de estar no Peru para realizar uma visita institucional aos órgãos reguladores e fiscalizadores da indústria de Gás Liquefeito do Petróleo (GLP), além de interagir com nossos associados locais. Durante minha estadia, também participei de uma audiência muito importante entre a Sociedade Peruana de GLP (SPGL) e o presidente da Comissão de Energia e Minas do congresso peruano. O cerne da discussão era o projeto de lei nº 679, que aborda a massificação do uso do gás natural no país.
É evidente que o Peru está empenhado em expandir sua infraestrutura de gás natural como parte de sua transição energética. Essa iniciativa é louvável, mas não pode ser vista como a única solução viável.
Um combustível adequado para a transição energética deve possuir uma série de características que o tornem uma opção viável e eficaz na busca por uma matriz energética mais sustentável e inclusiva. Algumas das características importantes incluem: ser ambientalmente amigável, com baixas emissões de gases de efeito estufa e outros poluentes; ser amplamente disponível e acessível a todos os estratos sociais, especialmente para aqueles em áreas remotas ou economicamente desfavorecidas, isso significa que a infraestrutura necessária para produção, distribuição e uso do combustível deve ser acessível e não discriminatória; ser seguro para armazenamento, manuseio e uso, minimizando o risco de acidentes e danos à saúde humana e ao meio ambiente, além disso, deve ser confiável em termos de fornecimento contínuo, garantindo a estabilidade energética e evitando interrupções no abastecimento; possuir uma alta eficiência energética, ou seja, produzir uma quantidade significativa de energia com o mínimo de desperdício possível; ser adaptável a uma variedade de usos e aplicações, desde a geração de energia elétrica até o transporte e aquecimento residencial; e ser economicamente viável em termos de custo de produção, distribuição e utilização, garantindo que seja uma opção acessível para consumidores individuais, bem como para setores industriais e comerciais.
Neste sentido, o GLP é, de fato, um combustível com características que o tornam uma opção ideal para impulsionar a transição energética na América Latina, especialmente em áreas rurais. Sua limpeza, acessibilidade, segurança, portabilidade, capilaridade e versatilidade, o posicionam como uma opção viável e eficaz para reduzir a dependência de combustíveis fósseis e promover uma matriz energética mais sustentável e inclusiva.
Com cerca de 90 milhões de pessoas vivendo em condições de pobreza energética extrema na região, é essencial reconhecer que a transição energética não pode ser uniforme. A disparidade econômica implica que as etapas desse processo variam significativamente em comparação com outras regiões do mundo. Mais importante ainda, essa disparidade destaca a necessidade de abordagens flexíveis e adaptáveis às realidades locais.
Uma transição energética precipitada, sem considerar essas realidades, poderia resultar em retrocessos significativos. A parcela mais vulnerável da população, ao ser deixada para trás, pode recorrer ao consumo de fontes de energia inadequadas e poluentes, como lenha, carvão, dejetos de animais e até mesmo lixo, que além de ambientalmente contaminantes, são extremamente prejudiciais à saúde, afetando especialmente para mulheres e crianças.
É imperativo considerar os passos intermediários nesta jornada rumo à sustentabilidade energética, e o GLP sendo confiável, seguro, altamente portátil, com infraestrutura que proporciona uma capilaridade única, permitindo alcançar até os locais mais remotos da América Latina sem a necessidade de grandes investimentos, deve, sem nenhuma dúvida, estar entre os combustíveis da transição energética.
Nossa preocupação, como associação representativa da indústria, é que o investimento massivo em infraestrutura de distribuição de GN, que está sendo realizado no Peru, em detrimento de uma adequada avaliação de economicidade e reduzindo os recursos do FISE para projetos sociais necessários, como o vale descontos de GLP, pode gerar distorções e acabar reduzindo os efeitos de um programa social de sucesso, que já vem demonstrando resultados, reduzindo a pobreza energética extrema no país. Para reflexão cabem as perguntas: realmente precisamos de gás natural a qualquer preço? Não seria mais efetivo se ampliássemos programas e benefícios sociais dedicados ao GLP, permitindo soluções imediatas que durariam por muitos anos? Não deveríamos debater mais esse tema com a indústria e a sociedade?
De uma forma geral, é fundamental que os governos da região reconheçam a importância do GLP como uma ferramenta eficaz na luta contra a pobreza energética e na promoção de uma transição energética justa e inclusiva. Investir em infraestrutura de outros energéticos, como por exemplo a de distribuição de gás natural, é muito importante, mas não pode ser feito às custas da exclusão de soluções energéticas acessíveis, disponíveis e imediatas, como o GLP.
Resumindo, podemos afirmar que não existe uma solução única. Devemos adotar uma abordagem inclusiva, aproveitando todos os recursos energéticos disponíveis e garantir uma transição justa e eficaz. Também devemos compreender que a transição energética na América Latina passa, obrigatoriamente, pelo GLP, uma vez que a pobreza energética é um problema real cuja solução envolve o empenho dos governos, que por meio de políticas públicas eficientes e bem direcionadas, podem e devem encontrar soluções aceitáveis. Tais políticas precisam não apenas ampliar o acesso à energia, mas também garantir sua sustentabilidade e acessibilidade financeira.
Em última análise, nossa transição energética deve ser guiada por uma mentalidade de inclusão e pragmatismo, reconhecendo a complexidade das realidades locais e adotando soluções adaptáveis e sustentáveis a longo prazo. Somente assim poderemos construir um futuro energético mais justo e resiliente para todos.
Fabrício Duarte
Diretor Executivo