Assegurar o acesso a uma energia acessível, segura e sustentável para todos e todas é um pilar fundamental dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (Nações Unidas, 2018). Entretanto, a realidade na América Latina e no Caribe nos mostra um quadro de falta de acesso adequado a serviços energéticos modernos, limitando não só o desenvolvimento econômico, mas também comprometendo a qualidade de vida das populações mais vulneráveis.

Segundo a CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e Caribe) a região contava, em 2022, com 665 milhões de pessoas, sendo que 13% desta população vivendo em situação de extrema pobreza e sem acesso a serviços energéticos de qualidade, resultando em uma situação denominada pobreza energética.

A pobreza energética não possui uma definição formal, mas pode ser definida como a falta de acesso a combustíveis limpos e comerciais, equipamentos eficientes e eletricidade, gerando uma alta dependência da biomassa tradicional, que é, principalmente, queimada em fogões ineficientes e poluentes.

De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 2,3 bilhões de pessoas no mundo não tem acesso adequado a fontes confiáveis e acessíveis de energia para cocção, como, por exemplo, o GLP. Ainda segundo a OMS, na América Latina a lenha é fonte primária para cocção para mais de 90 milhões de pessoas, causando morte prematura de milhares de pessoas, especialmente mulheres e crianças. Além disto, os custos financeiros associados às doenças relacionadas à poluição, causada pela utilização de lenha para cocção, atingem a ordem de bilhões de dólares por ano.

Ou seja, a pobreza energética é um problema real cuja solução envolve o empenho dos governos, que por meio de políticas públicas eficientes e bem direcionadas, podem e devem encontrar soluções aceitáveis. Tais políticas precisam não apenas ampliar o acesso à energia, mas também garantir sua sustentabilidade e acessibilidade financeira.

Este é o foco do estudo “Diretrizes para Redução do Uso de Lenha para Cocção”, realizado pelo professor Carlos Ragazzo (da FGV) e pelas pesquisadoras Ana Carolina Cordeiro e Bruna Cataldo, respectivamente doutoranda e doutora em economia pela UFF.

Partindo de um caso de sucesso, o Programa Auxílio Gás dos Brasileiros (PAGB), que prevê a transferência direta de renda bimestral, no valor equivalente à média do preço do botijão de gás, para famílias em situação de vulnerabilidade, obedecendo métricas estabelecidas por programas sociais do governo brasileiro; o referido estudo analisa, com profundidade, um conjunto de soluções que se aplicam às diversas realidades existentes no Brasil e que tem potencial para  atingir resultados transformadores.

Para a realidade de outros países da América Latina, o estudo pode servir como ferramenta para aperfeiçoamento de seus programas e mostra a importância da comunicação para o sucesso de qualquer iniciativa. É imprescindível comunicar os efeitos danosos da utilização da lenha no preparo de alimentos, principalmente para uma parcela da população que enxerga na lenha uma solução “gratuita”. Neste sentido, campanhas culturais são fundamentais para alcançar o resultado esperado.

Temos dois exemplos de sucesso, quando tratamos de campanhas relacionadas à substituição da lenha pelo GLP que tiveram papel fundamental na mudança do comportamento das pessoas:

  • No Peru, uma campanha governamental do “Fondo de Inclusión Social Energético” (FISE), direcionada especificamente aos beneficiários do programa, utilizando variados meios de comunicação, logrou alcançar seus objetivos, ampliando a conscientização da população.
  • Na Índia, onde havia entraves culturais ligados à falta de informação e ao medo na utilização do GLP, foram criados mais de 100 mil grupos (Panchayats) em aldeias de todo o país, apoiados pelos líderes comunitários, buscando conscientizar os cidadãos quanto aos benefícios do GLP, comparados com os combustíveis tradicionais e a biomassa.

Concluímos reforçando que combater a pobreza energética na América Latina é uma questão urgente que requer ação coordenada e estratégias multifacetadas, por parte dos governos da região. Garantir acesso universal a serviços energéticos modernos não só melhora a qualidade de vida das populações mais vulneráveis, mas também impulsiona o desenvolvimento econômico e protege o meio ambiente. Somente investindo em políticas públicas eficazes, comunicação eficiente e parcerias colaborativas alcançaremos um futuro energético sustentável e equitativo na região.

Fabrício Duarte – Diretor Executivo