No Brasil, em todos os anos eleitorais, três assuntos são debatidos de forma recorrente: a privatização da Petrobras, o preço da gasolina e do diesel, e o do gás de cozinha. Este ano não poderia ser diferente, e a greve dos caminhoneiros acabou por antecipar as discussões. O debate é sempre populista, girando em torno da tese de que esses combustíveis são caros no Brasil, e o gás de cozinha, em particular, devido ao seu caráter social, é vítima de uma série de mitos em torno do seu uso e do seu preço.

Um primeiro mito quanto ao uso é afirmar que o preço do gás de cozinha tem levado a um maior consumo de lenha. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), o maior índice de aumento do consumo de lenha não foi em famílias de baixa renda. A pesquisa mostra que o total de famílias que usam GLP não diminuiu. Ou seja, tudo indica que a lenha e o carvão estejam sendo usados de forma auxiliar, em algumas residências.

Um segundo mito é que o preço do gás de cozinha é determinado no mercado interno pela Petrobras, quando, na verdade, o preço do gás de cozinha, que é usado por quase 99% das famílias brasileiras, segue a tendência do mercado internacional, como a gasolina e o diesel. Outro mito é que gás de cozinha é caro no Brasil. Um botijão de 13 quilos dura em média 45 dias nos lares brasileiros, ou seja, mesmo depois dos aumentos recentes, custa menos de 1 real e 50 centavos por dia no orçamento familiar. Esse custo diário é o mais baixo de todos os insumos energéticos domésticos.

Se pensarmos, e é justo e verdadeiro, que o gás de cozinha poderia ser considerado um produto de primeira necessidade, a sua carga tributária é incompatível com os produtos da cesta básica. Em 2004, o governo federal reduziu a zero as alíquotas do PIS/Cofins que incidiam sobre o arroz e o feijão. Recentemente, foi anunciada a isenção do ICMS sobre o pão francês e a farinha de trigo, no estado de São Paulo. O mesmo tratamento poderia ser estendido ao gás de cozinha.

É ilusão achar que o consumidor final tem que ser protegido por preços subsidiados e artificiais, porque esses preços, no final do dia, acabam sendo bancados pela sociedade. Grande parte do subsídio ao gás de cozinha acabou beneficiando milhões de famílias de faixas de renda mais altas. A ideia de beneficiar os mais pobres através de preços controlados é falha, e representa um custo pago por toda a sociedade, inclusive pelos mais pobres. É importante que o governo tenha ferramentas de incentivo destinadas a quem mais precisa. Mas, também, é importante que o preço flutue, como acontece com os outros produtos à venda no mercado.

O que garante preço justo é a livre concorrência e, dessa forma, a flutuação de preços representa a realidade em qualquer mercado competitivo. No caso de preços controlados, os reajustes não seguem uma lógica de mercado, e isso cria nas pessoas uma expectativa irreal. Cada vez que os preços têm que ser corrigidos para ficarem mais próximos da realidade, o impacto dos aumentos provoca profunda insatisfação no consumidor e discursos populistas.

Durante os governos do PT, a grande diferenciação entre o preço do gás de cozinha e o preço do gás granel fornecido à indústria tirou competitividade deste último. Não é à toa que, no mercado internacional, 39% do GLP são usados nas indústrias, e, no Brasil, apenas 13%. Com distorções assim, é simplesmente impossível que algum investidor se interesse em avaliar a sua entrada no mercado nacional de refino ou na importação de GLP. Perde a sociedade e perde o Brasil.

Adriano Pires é diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE)